terça-feira, 24 de dezembro de 2013
quarta-feira, 18 de dezembro de 2013
segunda-feira, 2 de dezembro de 2013
terça-feira, 12 de novembro de 2013
domingo, 10 de novembro de 2013
“Coisas de menina”
Sentia-se diferente
há dois dias. Indisposta e triste até. Queixou-se com a mãe.
- Deixa de
frescura, Gabriela. Desde quando uma menina de onze anos tem motivos pra se
sentir mal? – retrucou a mãe, enquanto se voltava para a máquina de costura, apressando-se
para terminar uma encomenda a ser entregue no dia seguinte.
A resposta em
nada ajudou. Um pouco antes da novela das oito, Gabriela avisou que ia se
deitar. Como já havia voltado da escola e feito as tarefas que lhe cabiam, a
mãe não ligou, mesmo notando na filha certo abatimento, uma ausência de postura
ao andar, uma palidez curiosa; a isso julgou como sendo apenas “coisas de
menina”.
Gabriela só
queria repousar. Escovou os dentes, lavou o rosto e preparava-se para urinar
quando viu que de si escorria um líquido vermelho escurecido, uma pequena nódoa
que manchava a calcinha. O coração disparou. Assustada, a menina não sabia o
que fazer.
- Mããããe!
A mãe veio ao
encontro da filha e logo percebeu o que acontecia. Por estar nervosa – ainda não
estava preparada para um momento como esse! -, conversou em tom muito formal, falando,
entre gaguejos, os cuidados e, principalmente, os riscos a que a menina a
partir de agora estava sujeita. “Minha filha, minha doce menina, está crescendo,
enfim”, pensava a mãe, enquanto procurava um absorvente e explicava à filha
como usar. Gabriela ouvia tudo com atenção.
No banho morno
recomendado pela mãe, sorriu. Sentia-se mais viva, fluida e fêmea como nunca
fora. Uma certeza a inundava: crescia, enfim.
terça-feira, 5 de novembro de 2013
sexta-feira, 1 de novembro de 2013
Tomé
“No mesmo instante caiu sobre ele
névoa e escuridão, e, andando à roda, procurava quem o guiasse pela mão.”
(Atos 13:11 - Bíblia Sagrada)
Sempre duvidou de tudo que não podia compreender.
Precisava comprovar o que ouvia, via, sentia. Era um homem bom, mas extremamente
desconfiado. Chamava-se Tomé. Arriscava o mínimo, pensava o máximo, inquiria
sempre.
Até que, certa vez, andando Tomé por
uma rua movimentada, em plena luz do dia, caiu sobre ele névoa e escuridão.
Desespero e insegurança abateram o homem. Sem nada enxergar, embora o sol
brilhasse a pino, Tomé andava às cegas, procurando quem o guiasse pela mão.
Ninguém vinha, porém, em seu auxílio. As pessoas que assistiam a tudo temiam se
aproximar, pois não podiam crer no que viam.
Assim, engolido pela dúvida alheia, Tomé foi-se perdendo em meio à escuridão que lhe invadiu a alma. E, imerso em trevas, Tomé acreditou, enfim, que estava incompreensivelmente perdido para sempre.
Assim, engolido pela dúvida alheia, Tomé foi-se perdendo em meio à escuridão que lhe invadiu a alma. E, imerso em trevas, Tomé acreditou, enfim, que estava incompreensivelmente perdido para sempre.
segunda-feira, 28 de outubro de 2013
quinta-feira, 17 de outubro de 2013
terça-feira, 15 de outubro de 2013
terça-feira, 8 de outubro de 2013
quinta-feira, 3 de outubro de 2013
quarta-feira, 18 de setembro de 2013
Escrevo.
Para renovar o sentido da existência e
atrapalhar a morbidez das ideias.
Para aplicar inovações ao básico e retirar
excessos de abundâncias.
Para juntar os cacos, pedacinhos da vida que se
vão perdendo a cada despertar.
Para conectar pontas perdidas de.
Desembaraçar
fios dos.
Arrumar pensamentos em.
Distribuir sorrisos ou lágrimas por.
Escrevo para partear a gravidez de letras e
palavras que se me vão transbordando
e não cabem em peneiras.
terça-feira, 17 de setembro de 2013
Mudanças
O
tempo mudou de repente. Ou eu mudei? Olho pela janela e vejo coisas que antes
não estavam lá fora: o mato alto, as flores murchas, a água da piscina que vai
se esverdeando a cada piscada que dou. Mudei?
Volto
o olhar para a sala de estar. Nela estou, estático, apático. Recordando-me
apenas dos tempos de êxtase: casa cheia, amigos em demasia, sorriso, festa,
alegria. Mudei?
Tenho
apenas o desejo de dormir. Sem o risco de acordar, de repente, e me dar conta
do tanto de mudanças pelas quais passei como um mero transeunte na estrada. Do
tanto de mudanças que me perpassaram como a uma presa abatida em caça. Do tanto
de mudanças que. Mudei?
A
vida precisa ser intensamente vivida. Porque será, sem pena, vividamente passada.
quarta-feira, 11 de setembro de 2013
O dia em que vi Deus
Era apenas mais uma viagem de avião. Voltava de uma visita a amigos, noite passada em claro a discutir temáticas metafísicas, o
homem no centro de todas as coisas, transformando-se na essência de seu próprio
existir. Estava sonolento, cansado de tantas gnoses, ateísmos (psicoses?).
Crianças abandonadas na lixeira. Moça indefesa estuprada por bando. Genocídios.
Fatricídios. Pedofilias. Rejeição. Preconceito. Era incapaz de pensar nas
coisas da vida sem culpabilizar Deus pelas mazelas e injustiças terrenas.
Até
que olhei pela janela.
Eis que vi o céu tomado por um cinza
azulado, invadido pela branquidão das nuvens. Num repente, tudo se pintou, ao
longe, matiz de cores que ia do laranja ao vermelho-paixão, num espetáculo que
emocionaria ao mais descrente dos homens. Pensei: meu deus, alguém fez isso, não há como não ter sido assim. O mesmo que fez as guerras e dores e
dissabores?
Foi
quando vi o rosto Divino surgindo dentre as nuvens, em meio aquele espetáculo
multicor. Era imenso, mas sereno; olhava-me com candura. Em seu olhar, respostas. Fitamo-nos, apenas,
por alguns instantes. Riqueza de um momento em que tudo o mais – amigos,
passageiros, discussões – parecia fútil, tolo, dispensável. Sons inauditos me
invadindo ouvidos, peito, mente. No coração, um dilúvio de paz, lavando
incertezas e me firmando os passos em lugar seguro. Rendi-me.
Eu vi Deus. E essa visão
me completou por toda uma existência.
quinta-feira, 5 de setembro de 2013
É pra ver se você volta
Ao som de Mentiras, de Adriana Calcanhoto
Mentiras.
Enredara-se aquela relação em mentiras tantas que chegara ao fim. Ele apenas se
foi. Não era de seu feitio discutir. Tampouco insistir. Foi-se. Ela, porém, protestou,
como era – agora sim - de seu feitio.
Disse
que ia atormentá-lo se não voltasse.
Que
ligaria para ele várias vezes por vários dias.
Que
ele nunca mais teria paz.
Que
contaria para suas amigas sobre o canalha que ele era.
Que
estouraria o cartão adicional, além de sacar cada centavo da conta conjunta que
haviam aberto quando decidiram juntar dinheiro para se casar.
Que
faria uma carta anônima para a mãe dele, beata idolatrada, com obscenidades que
ele jamais ousaria dizer. Seria um escândalo!
Que
encheria a cara e passaria noites ao relento. E que quando alguém se
aproximasse para perguntar se queria ajuda, ela diria que só estava assim por
causa do amor que se foi. E daria ao bom samaritano o telefone dele, o canalha
que a abandonara.
Que
tentaria suicídio e deixaria, ao final do bilhete, o nome dele, a fim de que
fosse o culpado por sua morte.
Tudo
pra ver se ele voltava.
Mas
ele não voltou. Havia mentiras demais.
Ela,
percebendo a derrota, decidiu dizer apenas a verdade. Quando viu que não
conseguia, disse a si mesma que daria um passeio pela Ponte Rio-Niterói. E
lançou-se ao mar.
terça-feira, 3 de setembro de 2013
Tempo
Pousou a mão direita, lentamente,
sobre a esquerda. Olhou-as. Era difícil ver o quanto envelhecera. Olhou-as com
dor e pesar, com lembranças de uma vida que fora vivida há tanto tempo, meu
Deus, que nem parecia mais ser a sua.
Respirou fundo. E uma lágrima
deslizou, insana, por aquela sua velha face, tão enrugada quanto as mãos que
ainda observava. Ali, quieta, a espiar o tempo que lhe deixara tantas marcas –
ou será que espiava apenas as tantas marcas deixadas pelo tempo? – tentou, mas
não conseguiu impedir a lembrança de uma canção que ouvira quando jovem, e que
agora sabia, sempre trouxera uma doce verdade: O tempo não para.
Ergueu-se da poltrona de forro desbotado, tomou uma taça e
encheu-a de vinho. Sozinha na sala, abriu um sorriso amarfanhado e ergueu a
taça, trêmula, num derradeiro brinde ao Tempo.
sexta-feira, 30 de agosto de 2013
Sonho turquesa
Mergulhou, enfim. Não no mar: no
ar. E era tanta a imensidão azul que lhe invadia os poros, lhe atiçava os pelos
e lhe acalmava a alma que tudo parecia passar à sua frente em câmera lenta.
Sonho turquesa de infinita paz.
Ali, no ar, flutuava docemente
enquanto se esquecia de que há problemas na vida.
Ali, no ar, dançava ao som do
vento que a conduzia, na certeza de um momento divinamente especial.
Ali, no ar, perdia medos e
segredos; tornava-se feliz. Libertamente feliz.
Lançava-se ao vento, sem medos. Espaço
sem coação ou obrigações, pleno dos viveres bonitos que tanto ansiava que
fossem reais. Seus e reais. Sorria e era feliz naqueles instantes de flutuação
que se estendiam como uma toda vida. Gozava cada segundo. Sorvia. Nutria-se. Carpe diem, carpe diem.
Agarrava-se ao sonho azul. Porque
sabia que em breve acordaria numa manhã cinzenta,
cujas nuvens densas invadiriam
com pesar
a palidez de sua vida.
terça-feira, 25 de junho de 2013
Desaniversário
Encheu todas
as bexigas coloridas, deixando-as dispostas sobre o sofá. Recebeu o bolo e os salgados
que havia encomendado, fazendo questão de pagar tudo em dinheiro. Checou a
temperatura dos refrigerantes que havia colocado para gelar; estavam no ponto. Forrou
a mesa com a toalha cor de rosa, sobre a qual colocou outra, de renda. No centro
da mesa, pôs o bolo. Ao redor dele, talheres, pratinhos, espátula, guardanapos.
Trouxe as taças para a mesa, assim como a bandeja com salgados, quentinhos,
fresquinhos.
Sentou-se e
desejou que houvesse convidados. Que houvesse reais motivos de comemoração. Que
alguém se importasse com seu trigésimo quarto aniversário. Que não estivesse
sozinha. Que houvesse uma linda festa – a sua linda festa.
Aniversário:
dia em que se completa um ou mais anos de idade. Aniversário: relativo à
comemoração do dia do aniversário. Aniversário: alegria, festa, partilha,
comemoração. Bexigas coloridas. Bolo e salgados. Refrigerantes gelados. Mesa
arrumada.
Aniversário. Alegria.
Festa. Partilha. Comemoração. Então hoje era apenas seu desaniversário. Não
como os desaniversários de Alice no País das Maravilhas. Era seu desaniversário
porque lhe faltava alegria, festa, partilha, comemoração – embora lhe sobrassem
anos, danos, canos. Era seu desaniversário porque sua vida esvaía, bem como seu
prazer de existir e ser, justo no dia em que deveria haver alegria, festa,
partilha e comemoração. E enquanto se dava conta disso, cobria-lhe um temor -
mais que isso: um terror - de que sua vida estivesse sendo vivida toda ao
contrário, desde sempre. De que sua alegria profunda não passasse de um esgarçado
sorriso. De que seus sonhos dourados não fossem mais do que ilusões incolores.
Desaniversariava
e isso lhe causava dor.
E, doente que
estava, foi desaniversariando, desaniversariando, enquanto olhava para o bolo,
para a fumaça que saía dos salgadinhos, para os objetos dispostos sobre a mesa,
para as gotículas que brotavam das garrafas de refrigerante, para a renda sobre
a toalha cor de rosa... até desaparecer em meio às bexigas multicores.
sábado, 20 de abril de 2013
Desenho da infância
As duas
crianças brincavam de boneca, contentes porque estavam na companhia uma da
outra. Divertiam-se a valer. Não havia preconceitos ou rumor de maldade. Não havia
julgamentos ou classificações. Nenhuma segmentação ou estereótipo reinava
naquela brincadeira. Somente a infância se desenhando com lápis coloridos e
pedacinhos de giz de cera, num lindo quadro de pureza e sinceridade. Eram
felizes: ela, ele e as Barbies.
Mas chegou a
mãe dele, juntamente com a mãe dela. A primeira enfureceu-se:
- Garoto,
ficou louco? Menino não brinca de boneca!
E tirou com
aspereza da mão do filho a Barbie tão bonita, enquanto o levantava do tapete
emborrachado todo enfeitado com as letras do alfabeto. Separou-o bruscamente da
companhia da amiga, a quem devolveu a boneca.
A mãe dela
abaixou-se à altura da menina em uma contenção assustada, acariciando a Barbie
como num afeto à filha.
As duas
crianças se olharam. E havia perguntas e tristeza nesse olhar.
As duas mães
se despediram com um sorriso. E havia tensão e julgamentos nesse sorrir.
Enquanto a
cena acontecia, um sutil borrão ganhava forma, manchando a pureza daquele
desenho da infância.
quinta-feira, 11 de abril de 2013
Pai
O homem ergueu a mão para ele, mão pesada, calejada, quase
rústica. Sua mão grossa tinha o peso de uma eternidade e certamente deixaria
marcas na pele, na mente, na alma. Uma parte sua dizia “não bata”, a outra
gritava “ele merece”. Escutou esta, ignorando aquela.
Desceu a mão sobre o menino com todo o furor, mágoa e peso
que ela pudesse concentrar.
Ouviu-se um barulho seco, seguido de segundos de silêncio.
Até
que o filho explodiu em choros, balbuciando apenas, com temor, “pai!”
sexta-feira, 25 de janeiro de 2013
Des...encontros
Era noite e estava frio. Eles seguiam
em direções opostas.
Para ele, o fim de tudo, afinal. Para
ela, lembranças e dor no peito.
Ele pensava no tempo perdido ao
lado dela. Ela lamentava não estarem abraçadinhos naquela noite fria.
Ele tentava esquecer,
cantarolando uma canção, embora a canção lembrasse um passeio adorável que
fizeram. Ela insistia em recordar o tudo de bom que viveram juntos.
Ele se lembrou de que deixara sua
carteira com ela; mania que cultivava desde que iniciaram o namoro, porque
reclamava que a carteira no bolso o incomodava demais, melhor deixar na bolsa
dela. Ela apertou a bolsa contra o peito e sentiu o volume que a fez sorrir:
sem a carteira, ele iria voltar. Ele iria voltar!
A contragosto, ele deu meia volta
e pôs-se a apertar o passo, para alcançá-la logo. Ela, cheia de esperanças, se
virou e aguardou.
Ele a viu de longe e sorriu meio sem querer da mania que a
via reproduzir mais uma vez: passar os cabelos para trás da orelha três vezes
seguidas... Sinal de que ela estava nervosa. Ela sentia o coração bater mais
forte à medida que notara o vulto dele se aproximar.
Esqueci minha carteira, ele disse, sem coragem de olhá-la nos
olhos. Percebi agora. E fiquei feliz
porque sabia que você voltaria para pegar... Ela respondeu baixinho, quase
um sussurro frente ao peito dele, seus olhos buscando encontrar os dele em sua
direção. Estavam tão pertinho, corpos colados. Ela reclinou a cabeça em seu
peito. Assim, sem pensar na separação recente. Só para sentir mais uma vez sua
respiração. Ele tremeu ao receber a pressão suave do corpo dela. Fechou os olhos
sentindo o cheiro delicado daqueles cabelos ondulados que ele tanto admirava. Lembraram-se
de como era bom estarem lado a lado. E sentiram-se aquecidos naquela noite
fria.
quinta-feira, 24 de janeiro de 2013
Libertas quae sera tamen
Preguiçosa e indisposta naquela tarde chuvosa, a mulher recolheu-se ao quarto. Trazia na mão uma xícara quente de chá de boldo - que ela, amaríssima, tomava sem adoçar -, mas mantinha o coração gelado. Todo o rancor do mundo parecia guardado naquele peito e tudo parecia vir à tona sempre que se desenhavam tardes chuvosas. Inveja, despeito, ira. Nojo, vergonha, temor. Desprezo. Egoísmo. Frieza. Dor. Havia um pouco de tudo - e tudo de sobra. Remoía facilmente o que de pior a vida lhe dera, com a mesma rapidez que se obrigava a esquecer tudo o que recebia de bom...
Recostou a cabeça à vidraça da janela, olhando para o nada chuvoso, enquanto tomava seu chá. Sentia-se cansada de tudo, da dor em que vivia, de não ter ninguém - porque ela mesma a todos fazia questão de afastar. Teve o desejo de que tudo fosse diferente, que reaprendesse a sorrir, que sentisse a alma leve. Outra vez ainda.
Ocorreu-lhe uma ideia, um fiasco de luz e paz que invadiu sua mente como um piscar de olhos. Sem pensar, atipicamente, pôs-se a realizá-la. Depositou a xícara rapidamente sobre a cômoda, e nem se chateou por haver derrubado gotas de chá sobre a madeira religiosamente bem acabada. Caminhava com urgência em direção à porta (um breve sorriso lhe pintava o rosto), porta que também era de vidro, como a janela. Parou ao se ver refletida, misturando-se às gotas da chuva que caía. Era bela e parecia menos velha do que sempre se achava. Sorriu (meu Deus, ela sorriu!) enquanto descalçava os pés das meias velhas e frias. Porta aberta, barreiras vencidas, lançou-se sob a chuva que caía, gostosa e grossa, lavando-lhe o corpo, inundando-lhe a alma, trazendo o que, se ela ainda se lembrava, costumavam chamar de paz.
Liberdade ainda que tarde, pensou, feliz e rodopiante, qual criança ainda pura, ainda sem manchas, ainda feliz. Era leve, era livre, era ela - e viu que tudo isso era muito bom.
sexta-feira, 11 de janeiro de 2013
Via-crúcis
Caminhava apressadamente, mas se deteve alguns instantes na porta da igreja. Tempo suficiente para de novo sentir-se em dúvida quanto a entrar ou não. Sabia, porém, que precisava entrar. Seria bom, iria lhe fazer bem. Além do mais, que mal poderia alcançá-lo ali? Era uma sexta-feira, pouco depois do horário do almoço, quando as pessoas não tinham tempo de parar porque precisavam voltar ao trabalho. A praça estava cheia de transeuntes, mas a igreja estaria praticamente vazia.
Como não tinha muito tempo, decidiu entrar, e seus passos tornaram-se lentos, como se tomados por um profundo respeito. Tira a sandália dos teus pés, pensou ter ouvido, e apressadamente descalçou os tênis surrados. Seu coração acelerado forçava a cabeça a girar, contemplando a beleza daquele recinto. Teto, paredes, vidraças, santos. Cada detalhe para o qual olhava parecia assegurar-lhe de que aquele era o lugar onde ele deveria estar. Aproximou-se de um genuflexório e reverentemente se ajoelhou. Fronte e mãos abrigadas sobre o peito que agora serenava e se entregava à paz, silenciosamente rezou.
Não se sabe quanto tempo ficou ali. Pela serenidade que sentia, pela paz que reinava em seu coração, devia ter sido a tarde inteira. Mas sabia que havia um caminho que precisava seguir, gostasse ou não e, levantando-se, se benzeu, agradecendo ao Divino, ao mesmo tempo em que lhe pedia perdão.
Se possível, passa de mim este cálice, lembrou-se. Mas sabia que não era. Ali dentro, nenhum mal poderia alcançá-lo.
Mas, à porta do templo, três policiais o aguardavam.
Assinar:
Postagens (Atom)